quinta-feira, junho 8

Natureza Morta

Crescemos a dizerem que tivemos sorte. Que Portugal até teve uma ditadura leve, com censura leve, com tortura leve, com penas leves, com mortos leves. Uma coisa branda.
Mas tivemos gente presa aos quinze anos e a esperar dez por julgamento. Tivemos torturas de sono, 13 dias e 13 noites vigil, enredado em jogos de isolamento, privação e loucura. Tivemos mãe presas com os seus filhos de colo a serem ameaçadas através das crianças. Tivemos linchamentos de agricultores que de inverno iam à lenha nas herdades, queriam aquecer-se e cozinhar a sua comida.
Tudo isto reduziu-nos a um povo de silênco. Cinzento. Um ruído de fundo apenas.
Querem que esqueçamos. Os ex-agentes da pide viram o seu direito a reforma reconhecido antes dos resistentes anti-fascistas.
E nós cá vamos andando. Não nos esquecemos, não, mas lembramo-nos cada vez menos. A sede da pide transforma-se em condomínio privado e apenas temos uma vaga ideia de que talvez seja a tendência das coisas.
E armas para fazer o que queremos?

8 comentários:

a 08 junho, 2006 08:36, Anonymous Anónimo disse...

E tivemos uma mulher de camisola vermelha à frente de uma vaga de gente. Mesmo que as fotografias sejam a preto e branco, há registos suficientes para não nos esquecermos - e para nos irmos lembrando - da cor. Não necessariamente de um partido, antes de uma camisola em sentido contrário.

 
a 08 junho, 2006 11:19, Anonymous Anónimo disse...

Ninguém foi mandado para a Sibéria, não houve chacinas de aldeias pacíficas como no Tibete, não se emparedou ninguém, os atletas não fogem dos seus países em cada digressão ao estrangeiro em campeonatos internacionais como os cubanos.

E no entanto faz-se um escarcéu do caralho!

 
a 08 junho, 2006 15:48, Blogger Manuel Neves disse...

Sim. Um "escarcéu do caralho". Uma coisa sem fundamento, que até podíamos esquecer (ou então calar). Porque há gente que pensa que falar contra o estado novo é ser a favor dos gulags.
Há quem justifique o que foi feito aos que queriam pensar (e aos que queriam pensar marxismo) com o facto de "já se ter feito pior" (alguém aqui defendeu o que se passou no Tibete?) ou disso ter sido feito em nome de uma coisa sem a representar (porque acusar que ser X é mau porque já se fizeram coisas contrárias em nome de X, sem se seguirem os ideais X não faz sentido).
E querem que não façamos um "escarcéu do caralho". Querem que eu finja que em Abril não se passou nada e que até ia viver bem sem a Revolução dos Cravos.
Vamos sempre fazer um "escarcéu do caralho". Porque o tempo de nos calarmos era o tempo do fascismo e dos pides.


25 de Abril Sempre! fascismo nunca mais!

Manuel, sem medo de assinar, Neves

 
a 08 junho, 2006 15:49, Blogger Manuel Neves disse...

Falta uma vírgula a seguir a "...ideais X".
Manuel Neves

 
a 08 junho, 2006 18:39, Anonymous Anónimo disse...

25 de Abril uma vez por ano! E foda-se, é sempre o mesmo paleio por aqui?

Manuel, já te disse que a tua poesia me excita?

Miguel, também sem medo de assinar, Neves

 
a 08 junho, 2006 19:06, Blogger Manuel Neves disse...

Nunca mo tinhas dito, mas é natural porque julgo não te conhecer. Mais natural ainda porque não escrevo poesia.

25 de Abril todos os dias do ano. Eu gosto de celebrar a Liberdade todos os dias. Chamem-me fundamentalista, até gosto.

Quanto ao "paleio": por aqui vamos entretendo-nos a escrever. Gostamos de críticas e todos os etecéteras (é assim que se escreve por extenso). Mas eu, pessoalmente, gosto das mesmas fundamentadas. O teu discurso cheira-me a anti-esquerda básico, lamento. Acho mesmo que és capaz de melhor, já que a sugestão de "já ninguém vos pode ouvir" não invalida a mensagem.

Manuel Neves

 
a 08 junho, 2006 19:09, Blogger Manuel Neves disse...

Nunca mo tinhas dito, mas é natural porque julgo não te conhecer. Mais natural ainda porque não escrevo poesia.

25 de Abril todos os dias do ano. Eu gosto de celebrar a Liberdade todos os dias. Chamem-me fundamentalista, até gosto.

Quanto ao "paleio": por aqui vamos entretendo-nos a escrever. Gostamos de críticas e todos os etecéteras (é assim que se escreve por extenso). Mas eu, pessoalmente, gosto das mesmas fundamentadas. O teu discurso cheira-me a anti-esquerda básico, lamento. Acho mesmo que és capaz de melhor, já que a sugestão de "já ninguém vos pode ouvir" não invalida a mensagem.

Manuel Neves

 
a 09 junho, 2006 00:01, Blogger Hugo Bastos disse...

Realmente, como se disse ontem no debate que se seguiu ao filme Natureza Morta, o 25 de Abril não pode ser só reduzido ao dia da Liberdade (e a Liberdade já não seria pouco).
Durante o fascismo existiam alguns "livres". Os que mantinham a repressão sobre todos os outros, para que pudessem gozar essa liberdade.
Mas durante o fascismo houve também histórias de luta e resistência. Pequenos heroísmos, tão facilmente esquecidos, mas que implicaram tanto sofrimento. E dentro dos que lutaram (e houve gente de várias organizações e ideologias), sempre se reservaram aos comunistas as mais duras "medidas de segurança", as penas mais altas, a mais acesa perseguição, a morte mais fácil.
É natural que os livres de então, e os que actualmente conservam lugares no Estado e no poder económico que cedo retomou as rédeas do país, desdenhem Abril.
Mas nós não esquecemos.

 

Enviar um comentário

<< Página Principal