Chess is a lovely game I
Ele leva aquilo a sério. Está de calções porque está calor, mas veste uma camisa por respeito. O xadrez é para se levar a sério. Acaba o cigarro sempre em silêncio e entra na sala. Faltam dez minutos para o jogo começar. Senta-se, começa a preencher o cabeçalho da folha de registo da partida e concentra-se. As pessoas passam à volta dele, olhando sérias para a mesa número um do torneio. Ele já nem as vê. De cor e salteado, revê uma a uma as variantes preparadas ontem à noite.
Ela, ao contrário do costume, não está atrasada. Entra com aquele ar entre o traquina e o competitivo (ao contrário do dele, que é um competitivo sério), de saia comprida e camisa fresca que lhe descobre os ombros. Senta-se, cumprimenta-o com ar bem disposto e procura a caneta na carteira (uma daquelas carteiras regateadas por uma bagatela numa feira numa cidade europeia qualquer) e preenche o cabeçalho da folha enquanto morde a tampa da caneta e revela os seus tiques de menina entusiasmada: pára de escrever várias vezes para olhar para o tabuleiro (como se ele já tivesse jogado e as peças não estivessem na posição inicial) e começa a mexer as pernas, em pequenos movimentos rítmicos.
Cumprimentam-se com um aperto de mão. Ela olha para os olhos dele. Ele só olha para o tabuleiro. E ele, de brancas, empurra com firmeza o peão de dama duas casas. Deixa ficar os dedos pousados sobre a peça mais um segundo, larga-a e carrega no relógio.
d4 escreve ele, com letra certinha e ela com letra viva e grande.
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