quarta-feira, julho 5

TODAS AS CRIANÇAS INVÍSIVEIS


O filme "All the invisible children", somente em cena em Lisboa pelo El Corte Inglés, trata-se de um projecto patrocinado pela Unicef e a World Food Program com o intuito de sensibilizar as populações com dinheiro para gastar em idas hedonistas ao cinema, simbolizando sete diferentes situações sociais dramáticas em que as crianças são os maiores feridos psicológicos, porque a sua juventude e inocência é-lhes pressionada e têm de agir sem brinquedos nem desprendimento, mas consoante as carências económicas vigentes.
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Um ensemble de realizadores talentosos foi escolhido para reflectir esta dura tarefa de denúncia artística ou, mais uma pueril chamada de atenção para a disparidade ultrajante em termos de qualidade de vida entre os povos do chamado terceiro mundo e o consumo fútil das grandes metrópoles urbanas do Ocidente chamadas de Babilónias.
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Curta 1 Do Burkina Faso, Mehdi Charef (cineasta desde sempre envolvido em termas humanitários) mostra-nos, através dum estudo cuidado da luminosidade e da novidade nas trajectórias dos planos, a história de "Tanza", um guerrilheiro de nove anos já bastante experimentado na luta de mílicia tribal pelas montanhas, vegetação tropical e oásis, contra a ocupação de mais um governo autocrático liderado pelo exército para escravizar seus povos com trabalhos mal remunerados ou impostos, faz-nos interrogar porque é que as guerras étnicas favorecem uma minoria em prol da maioria ser explorada, retiram o direito à educação e higiene de uns oferecendo-lhes em troca a doença e a violência.
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Curta 2 Em seguida, para animar o tom deveras desesperante deixado pelo final da primeira curta metragem, surge "Blue Gipsy" do esquizofrénico Emir Kusturika, após uma sequência inicial em que um carro fúnebre choca frontalmente com uma carripana com música de casamento, esta aventura passa-se no último dia dum jovem num reformatório para reabilitação de delinquentes na Sérvia, o consequente confronto com a sua gigante família cigana de vigaristas extremamente cómicos e nada ortodoxos e a conclusão de que no mundo real, para alguns, não existe ninguém que cuide nós e nos proteja das animosidades da sorte, é preferível estar-se preso nesse caso.
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Curta 3 Com um argumento co-escrito com as suas duas sobrinhas, o controverso Spike Lee oferece-nos o decadente "Jesus Children of America", começa com uma hilariante conversa sobre qual é a super-estrela do rap, 50Cent ou TheGame, que aguenta com mais balas no bucho, tema de discussão banal para meninas de 12 anos numa escola pública do guetto nova-iorquino, e termina com a dolorosa aceitação do que é ter pais viciados em crack com traumas da Guerra do Golfo e ainda a extrema ignorância face ao problema do contágio da sida em crianças infectadas à nascença que necessitam de aconselhamento progressivo pelos grupos de apoio escolar.
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Curta 4 De seguida, surge "Bilú e João" da realizadora Kátia Lund (dirigiu quatro episódios da Cidade dos Homens) directamente da civilização das favelas abafadas pelos arranha-céus de São Paulo no Brasil, onde milhões de famílias lutam com todas as forças por uma vida de sobrevivência através de todos os meios possíveis, em particular, graças à recolha e venda de lixo a peso, desde latas, a cartão, a cobre, a qualquer outro produto que possa ser reaproveitado, lá pelo meio desse mundo de adultos, negócios, jogos de bairro, querelas territoriais passeiam-se dois jovens irmãos, aprendendo a regatear.
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Curta 5 Da Inglaterra, o clássico Riddley Scott e a sua filha Jordan assinam "Jonathan", o mais metafórico e menos ostensivamente crú dos mini-filmes, trata-se da regressão até à infância dum fotógrafo atormentado que acabou de voltar das zonas mais desfavorecidas de África para relatar o quão mal se vive lá e o quanto a nossa cegueira televisiva nos esconde com alienação e diversão fácil, em vez de provocar as gentes com excedentes monetários até à solidariedade para com seus semelhantes seres humanos que passam por tantas escusadas dificuldades, numa muito bonita filmagem dum pântano irlandês chegamos até a um campo de refugiados menores juntos e salvos dum pós-guerra mitológico.
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Curta 6 Já tinha participado como assistente de realização do "Carteiro de Pablo Neruda", "Gangs de Nova Iorque" ou "A Paixão de Cristo", mas aqui Stefano Veneruso concretiza "Ciro", a crónica dum pré-adolescente cuja família precisa da sua ajuda para se alimentarem todos, pelo que decide imiscuir-se no roubo e tráfico de todo o tipo de items assaltáveis, o típico jovem pobre que inveja as outras crianças que têm produtos que ninguém lhe pode comprar e que, graças à possibilidade de fugir pelo meio da multidão anónima da cidade de Nápoles arrisca-se ao lucro fácil baseado na impossibilidade da lei em cadastrar menores de dezasseis anos e lá vai ele em mais uma bela corrida pelo asfalto para ir gastar tudo em fichas de feira popular e num novo par de ténis.
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Curta 7 Para finalizar, surge outro veterano hollywoodesco, John Woo desta vez filmando na China um conto que expõe a dualidade de vidas devido ao poder de compra, entre "Song Song and Little Cat", uma menina mimada pelas suas imensas bonecas de porcelana, lições de piano e discussões intermináveis dos pais à beira dum divórcio e outra menina, da mesma idade, cujo avô de adopção a descobriu abandonada e recém-nascida dentro de um contentor onde este procurava seu sustento de sem-abrigo, a primeira vive angustiada sem compreender os intuitos suicidas da mãe rica farta da sua vida farta na sua mansão silenciosa e desapaixonada, enquanto a segunda cozinha contente os petiscos que repesca das sarjetas do mercado diário poupando todos os dias pelo sonho de passar a ir para a escola, entretanto vai sendo mal-tratada pelo patrão que alimenta orfãs em troca destas passarem o dia todo tentando vender suas rosas a turistas ou habitantes locais demasiado apressados e egoístas para raramente pararem para pôr em questão quais serão as atribulações que tanta gente passará para sobreviver numa enorme capital mundial como Xangai.
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De nada adianta ir ver filmes brilhantes se mal surgem os créditos finais começamos logo a pensar de novo nas nossas preocupaçõezinhas fúteis comparadas com as carências alimentares e emocionais de tantas crianças por todo este globo embrenhado em injustiça, esquecimentos, boas intenções provenientes de demasiada informação, omnipresente e imediata, preconizada pelos novos meios de informação tecnológica mais preocupada em cegar que a iluminar: "O cidadão Ocidental é um gigante em informação mas um anão em acção política" (Dominique Wolton). Portanto da próxima vez que alguém vos abordar no metropolitano não reajam com frieza nem com receio da aproximação tão pouco comum nas cidades onde ninguém se conhece nem quer conhecer, parece que todos preferem ficar no seu canto hegemónico censurando as escolhas estéticas e generalizando sobre as raízes étnicas dos outros, lutem contra o fascínio da desensibilização e discriminação tola, sussurando para o companheiro de assento "Este país está a andar sempre de mal para pior..." Digam bom dia, boa tarde e boa noite com um sorriso de curiosidade pelo camarada do lado na cara e VOTEM! PARTILHEM! COMUNIQUEM! ABDIQUEM!
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por: João Meirinhos

3 comentários:

a 18 julho, 2006 08:04, Anonymous Anónimo disse...

todas a preocupações são fúteis contanto que não despertem acções.

 
a 12 agosto, 2006 08:26, Anonymous Anónimo disse...

I say briefly: Best! Useful information. Good job guys.
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a 17 agosto, 2006 13:44, Anonymous Anónimo disse...

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