domingo, fevereiro 25

Sopa Branca

Ainda ontem pensava inconsequentemente que, ultimamente, a nostalgia não me tem ocupado tempo nas filosofias. Entretanto, recebemos notícias. É um marco, uma espécie de ponto de viragem, o primeiro e-mail (que as cartas estão fora de moda) que se recebe de alguém que foi em viagem. Ela pede-nos que escrevamos no blog. Aqui deixo um bocadinho dos primeiros dias da R. Acrescentei as cedilhas, que o teclado dela não tem. Até já.
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« Tenho experimentado imensa comida nova. Eles utilizam muitos vegetais e muitas especiarias. às vezes sâo tantas especiarias que depois de duas colheres de sopa branca, já nâo tenho fome. Mas também há coisas boas, saborosas. Experimentei um vegetal que - segundo a Tanja - era utilizado pelos nossos ancestrais europeus no lugar da batata, quando esta ainda era menosprezada. Uma característica engraçada nos austríacos que conheci, é que eles utilizam nas suas refeiçôes os alimentos da época. Nâo se poem com mariquices de importar alimentos de fora só porque lhes apetece. Eles respeitam, de certa forma, os horários da Natureza. E estâo satisfeitos com eles. Mesmo umas voluntárias austríacas que conheci nos primeiros dias e que nada tinham que ver com a comunidade, disseram-me, com um ar muito óbvio, que agora nâo é tempo de cogumelos, que nâo era suposto esncontrá-los na mesa. Por volta de Outubro, vâo aos bosques buscá-los. Por falar nisso, outra coisa interessante é o facto de as pessoas irem aos bosques como vâo ao cinema. É uma actividade recreativa tâo ou mais interessante para eles. »

segunda-feira, fevereiro 19

Arena

- De Pessoa, há uma fotografia, do ano da sua morte, que me vem perseguindo. Matar-se já não é um gesto irrepetível, individual (dirigido contra si próprio). O suicídio começa a ser colectivo, nosso contemporâneo.
- Os pobre-diabos deste mundo (e os donos deles sentam-se ao lado uns dos outros, à nossa vista) só têm uma solução: organizar-se inteligentemente. Ou morrem. Agradeço ao escritor norte-americano Jack London (aventureiro e suicida) o cão de trenó que me deu. É infalível. Quando há uma fenda (neste mundo gelado) estaca, eu aproximo-me dele para ver o que há, e ficamos os dois ali a pensar na rota e na puta da vida.
A vida está com os cornos desembolados; enquanto grandes toureiros a enfrentam, na arena, eu, na fasquia, observo como ela marra. Quero aprender, com eles, a voltear bem a capa, ou a colhida é certa.


Sebastião Alba, in Albas

sábado, fevereiro 17

Boa Viagem



R. é a rapariga que inventou o nome «Madeixas do Bicho». É a rapariga dos caracóis risonhos e das saias-de-roda filosóficas, que me fazem ficar a pensar que a roupa, apesar da profanação pela moda e da massificação da venda-consumo pela indústrias de confecção, ainda pode ser uma janela de expressão, o início de uma conversa. É a rapariga das cerejas, das ameixas pretas e da cor-de-tinto. É a rapariga que fugiu ao fado, dançou comigo o drum'n'bass e amanheceu depois. E, por fim mas não menos importante, a única pessoa que conheço que é capaz de saltar do chão para um sofá dentro de um saco-cama.

Carnaval da FML em 1933


"NA FACULDADE DE MEDICINA - Foi um verdadeiro acontecimento mundano o Baile realizado na Associação Académica da Faculdade de Medicina."
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in Ilustração, nº5 (173) - 8º Ano, 1 de Março de 1933
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Aposto que aqui no meio poderíamos encontrar um professor nosso. Reparem como, já na altura, a "nata da nata" tinha um ar de compostura adornada com divertimentozinho artificial. Reparem, apesar do pouco que a escassa nitidez deixa observar, nas boquinhas encolhidas e deprimidas e no papillon do tipo de smoking e boca aberta em riso (que ainda é o único que parece estar a ser honesto na sua euforia).

domingo, fevereiro 4

Joana Come o Papa

Come a papa
Joana come a papa
Come a papa
Joana come a papa
Joana come a papa
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Um, dois, três
vejam só o que ele fez
quatro, cinco, seis
agarrou nos seus fiéis
e disse: "quem abortar não escapa!"
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Come a papa
Joana come a papa
Come a papa
Joana come a papa
Joana come a papa
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sete, oito, nove
"e sempre que o sémen chove
dez, onze, doze
o homem que repouse
e a mulher que faça a papa"
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Come a papa
Joana come a papa
Come a papa
Joana come a papa
Joana come a papa
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Come o Papa
Joana come o Papa
Come o Papa
Joana come o Papa
Joana come o Papa
.
treze, catorze e meio
não há cruz que ponha freio
dezasseis, dezassete
ao aborto da Suzete,da Joana e da Urraca
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Come o Papa
Joana come o Papa
Come o Papa
Joana come o Papa
Joana come o Papa
.
Um, dois, três
uma mulher de cada vez
quatro, cinco, seis
pôs na voz mil decibéis
e mandou calar o Papa
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Come o Papa
Joana come o Papa
Come o Papa
Joana come o Papa
Joana come o Papa
.
sete, oito, nove
quando nada se resolve
dez, onze, doze
à espera que a mosca pouse
tem de se mudar o mapa
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Come o Papa
Joana come o Papa
Come o Papa
Joana come o Papa
Joana come o Papa
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treze, catorze e meio
hipocrisia é tão feio
dezasseis, dezassete
é incrível se se mete
a mandar em mim o Papa
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Come o Papa
Joana come o Papa
Come o Papa
Joana come o Papa
Joana come o Papa
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Vota sim
Joana vota sim
Vota sim
Joana vota sim
Joana vota sim
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letra: diana c/ pedro e zbm
vozes: pedro e diana
guitarra: pedro
piano: oboé
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http://www.myspace.com/sethmaldito/

sábado, fevereiro 3

Parto clandestino?

Um dos argumentos mais fantásticos do "não" é o facto do Sistema Nacional de Saúde não ter dinheiro e/ou meios para levar a cabo as IVGs, caso o "Sim" ganhe dia 11 de Fevereiro.
Bom, para já importa explicar que o aborto é médico até às 9 semanas. Ou seja, faz-se uma Ecografia, dão-se comprimidos e uma semana depois volta a fazer-se uma Eco. Entre as 9 e as 10 semanas é médico - cirúrgico, o que significa que além de comprimidos é necessária uma pequena cirurgia, que não necessita de internamento.
Ora, se o SNS não pode realizar estes procedimentos, temos que pensar no que acontecerá às mulheres. Não abortando nos hospitais e não abortando clandestinamente, resta-lhes seguir a gravidez. O que, obviamente, obriga a seguimento por consultas com análises e ecografias. No parto, há inclusive um internamento.
É exactamente o mesmo número de mulheres. Logo, se não há dinheiro para as mulheres realizarem abortos até às 10 semanas, também não há para prosseguir as mesmíssimas gravidezes. E então, além do aborto clandestino, o "não" acaba de inaugurar as gravidezes não-seguidas e, pasmem-se, o parto clandestino.